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Mostrando postagens de agosto, 2015

TRANSparente, Linda!

Era sexta- feira, dia de prenda das turmas de terceiro ano na minha escola, é uma tradição onde as pessoas se vestem de super heróis, heroínas, personagens de desenho é um rito de passagem para se deixar o ensino médio e adentrar na faculdade. Neste dia, a prenda era uma espécie de inversão de gêneros e é lógico que todos consideraram isso pura diversão, um dia para descontração. Mas eu sei, nós sabemos que é só mais um modo de reproduzir transfobia e reforçar que não estamos totalmente preparados para uma sociedade não cisnormativa, como homens debochando de travestis e mulheres reproduzindo o machismo que as aprisiona, desde sempre! Mas não escrevo isso não para protagonizar este momento, pois sou cisgênero, não! Faço isso para tentar representar os sentimentos percebidos neste dia e espero acertar. Ressalto que não a vi durante as aulas, não andei pelos corredores para saber sobre o que todos comentavam, mas durante os vinte minutos do recreio eu vi e tive vontade de chorar pe

Nunca Tivemos Fome

Quando eu tinha quatro anos minha mãe me deu uma notícia, disse-me que esperava outra criança, que seria meu irmão. Ah, eu dormi e acordei por dias com um sorriso alegre no rosto, mal podia esperar que os meses, que ela dizia que ele ainda demoraria passassem, os dias, se passavam como minutos, Em meio a isso eu via uma certa angustia no olhar dela, meu pai e minha mãe são o antônimo um do outro, ela a proximidade de assistência. ele uma distância próxima, incongruência. Minha mãe teve mãe, não tinha pai, ele a abortou junto com suas irmãs, àquela época mulher sem marido, sofria em dobro, e minha mãe sofreu com sua mãe, irmãs. Minha mãe carrega nas mãos os calos da menina que outrora foi, que mal tinha forças para carregar um caderno e já levava no lombo o peso do filho dos outros, da sinhá, ela escrava moderna, trabalhava para comer e pra morar! a fome deserda. Com meu pai não foi diferente, tinha mãe e pai, mas a fome também bateu-lhe à porta, e o vinagre ame

Os Pés das Meninas

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Tinha uma menina, pequena, franzina, curvada sob seus próprio ombos. Tinha uma menina, de pés largos, descalços, sozinha, sonhando. Percalços do mundo, carregava nas mãos,um mundo, pesado, em 500 páginas, leves! Folhas amareladas, desses longos anos, calhamaço passado de mão em mão, por décadas, nunca viu solidão abandono, só do irmão, que devora suas letras como pão! E a menina, a menina, lambia os dedos, como alguém que acabara uma refeição, para passar a outra página, curiosa, para saber um pouco mais sobre as letras, os versos, as prosas, a história, que é deles, que é nossa, que nunca foi de ninguém, negação! E a capa do livro já quase desfeita, enfeita mais uma mão, e enche mais uma mente, que sente, ao tocar a parte mais dura, mas mais suave, nela está escrita, História d'mãe África. A menina não é mais magra, franzina, comeu todas as letras, devorou cada vírgula, e cuspiu

O Mundo / As Pessoas.

O mundo quer tudo de nós, Mas quem nos prepara para o mundo? O mundo nos devora, mastiga nossas almas e cospe retalhos sub-humanos! O mundo da humanidade, a humanidade da perversidade a perversidade do desprezo, do menosprezo, O mundo é perverso, mas as pessoas são sua escória. As pessoas não nos mastigam e absorvem, como o mundo, as pessoas cospem em nós, nos diminuem, nos matam, O mundo é mundano, profano, incondicionado, as pessoas são estruturais, o mundo é o caus, as pessoas são a ordem, que provocando desordem, que tolhem. O mundo nos destrói, basta não se encaixar a este tabuleiro de peças, peças de encaixe, quebra cabeças, mas algumas pessoas não tem lugar nem todas as peças são dadas ao jogo. Essa humanidade conveniente, essa sub-humanidade, sub- cidadania, sub- integração, o mundo é o caus, nele você faz seu lugar, as pessoas são a ordem, e não te aceitam em lugares determinados. No final tudo é um coliseu, sua face, sua pele define se

É Mãe

É mãe, te vi a três dias, mas parece que uma eternidade nos separa. Ainda me lembro das suas frases de final de domingo,  aquele riso aberto, aquela mania de falar besteiras sobre o mundo e arrancar de mim um riso espontâneo. Aquele jeito doce, sereno, correto de me ensinar o caminho e logo depois da lição, soltar a minha mão e dizer, caminha sozinha, mas não só. É mãe, ainda lembro das suas concessões, das sua tristeza e batalha. Ainda lembro que você deu dois passos para trás para que eu pudesse buscar o meu sonho. Ainda sinto o cheio das suas roupas, a luz do seu peito ainda me guia pelo caminho, mesmo que tortuoso. É mãe, ainda lembro daquele dia, em que uma senhora na rua disse:  "- Que menina quietinha, como ela se chama?- e a senhora respondeu: "-Marcélle" Ainda sinto, foi aquela a primeira vez que me senti humana, verdadeiramente humana. Eu vi refletida na iris dos seus olhos minha imagem e ouvi dos seus lábios, os filhos são para o mundo